sexta-feira, 18 de março de 2011

Depois de ter visto o videoclip no post abaixo em modo repeat, algo me dizia que este trabalho não me era estranho, e dizia cá para dentro: "mas tu já viste algo do género! Mas onde?"
De repente fez-se luz! Ahhhh lá está!!! .... Há um ano atrás, enquanto passeava com um amigo pelas ruas de Londres, reparámos numa imagem de um rosto "cravada" na parede. Nessa altura foi-nos dito que o artista era português, e que era de alguma forma, conhecido em Londres. Aqui está!


photo made by JSG, LON ´10


Alexandre Farto (aka Vhils) é um artista que tem vindo a construir um percurso que faz confluir dinamicamente uma plasticidade intensa com um pensamento social e político provocador e directo. Apesar de muitos dos seus trabalhos apresentarem slogans e statements claros e directos, a afirmação política do seu trabalho subverte a ideia de que o político se dá por comunicação – aqui, o político faz-se: desde já, desde o primeiro minuto, desde o desejo que cria uma imagem. Esta força inerente ao seu trabalho cresceu com o próprio artista: uma história de vida ligada à observação e à intervenção no espaço urbano, como um operário silencioso que reconhece e evidencia em cada superfície a humanidade que ela reclama, esconde ou esmaga – Alexandre Farto concentrou-se desde cedo num trabalho sistemático de encontro entre dois universos crescentemente afastados: a cidade e os que nela habitam – o anónimo faz-se espelho.

Se, anteriormente, Alexandre Farto desenvolveu um trabalho sobre o rosto – dar rosto, o dom do rosto, o rosto como limite e lugar de violência e renovação -, o seu trabalho actual realiza como que um regressar ao ponto inicial: a cidade – o lugar do comum, onde os rostos se diluem e se constituem a partir de um sistema abstracto de criação de individualidades standard – o lugar em que o comum e a comunidade se tornam continuamente conceitos quase inconciliáveis. O rosto da cidade, diríamos, torna-se agora matéria de um trabalho de evidenciação da densidade humana que a constitui, das fragilidades que compõem as suas relações, os seus percursos, das direcções dos olhares e das palavras que se cruzam diariamente em cada não-lugar. Regressar, ou antes, reconfigurar a cidade enquanto lugar – relacional, histórico, centrado em identidades (M. Augé). Transformar esta problemática do dar rosto a, da criação de lugares, numa questão latente em cada objecto e em cada elemento da cidade – os lugares podem ser transparentes, dar passagem de uns para os outros, dar entrada a habitantes inesperados, estranhos à sua planificação e administração. Na Agência de Arte Vera Cortês, Alexandre Farto apresenta a sua primeira exposição individual. Sobre a demasiado evidente questão acerca do espaço expositivo e das intenções do seu trabalho, Alexandre responde com a simplicidade inquietante que caracteriza o seu scroll down for English versiontrabalho: este é também um espaço da cidade, cujas paredes podemos escavar até à transparência ou, pelo menos, até à porosidade que permite o indivíduo que entra. «Even if you win the rat race, you’re still a rat» - o poder sobre o outro é uma ilusão que resulta da opacidade das paredes que colocamos em nosso redor.

Cíntia Gil (aqui)

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