Querido FMI,
Pois é, ao que parece já estás entre nós. Calma, calma, não estou aqui para te apedrejar, para dizer que só nos vens dar cabo da vida, que a partir de agora andaremos a pão e água. Tudo por tua causa. Nada disso. Pela parte que me toca, quero apenas dar-te as boas vindas ao nosso maravilhoso país com sol. E, porque sou pessoa de um altruísmo imenso, deixar-te algumas dicas de sobrevivência. Agora que és um de nós, é melhor que te vás habituando. Ou isso ou começa já a enfiar caixas de Xanax no bucho, é capaz de ser a solução mais prática. Mas pronto, não vamos embarcar numa onda de pessimismo. Só tens de perceber mais ou menos como é que funcionamos e, a partir daí, tudo correrá sobre rodas. Então é assim, é muito provável que quando precisares de alguma coisa (seja um documento ou um agrafador), te respondam qualquer coisa como "ah, isso não é comigo". Não é por má vontade. É que por cá todos temos um papel muito bem definido. Há quem só trate de papéis, há quem só trate de agrafadores e, aparentemente, há gente que não trata de coisa nenhuma, mas pronto. Aos poucos vais perceber quem faz o quê, vais concluir que ninguém faz nada, e começas tu a tratar das coisas por ti. Também é normal que tudo seja um grande problema sem solução. Até te pode parecer uma coisa simples,mas a nossa tendência para o drama e para dizer "ui, isso é impossível" é mais forte do que nós. Mudar uma lâmpada é impossível, marcar uma reunião é impossível, TUDO é impossível. Adiante. Caso tenhas algum problema no computador, não vale a pena recorrer aos serviços de um informático. Vão cobrar-te uns 250€ para dizer uma coisa tão simples como "já experimentou desligar e voltar a ligar a máquina?", por isso não vale a pena. Guarda a dica, que foi de graça. Se precisares de perguntar alguma coisa ao colega da secretária ao lado, é muito provável que ele não esteja por lá. Nunca. Procura junto à máquina de café (é aí que se concentra o grosso da classe trabalhadora portuguesa) ou na rua, ao pé de um cinzeiro. Ou então vê se não meteu uma baixa fraudulenta ou se não está de assistência a uma avó que já morreu três vezes. No que toca a chamadas para organismos públicos (e para os outros também), procura fazê-las de modo a incomodar o menos possível. Às dez a malta ainda está a tomar o pequeno-almoço, às onze e um quarto fez a primeira pausa para comer qualquer coisinha, à uma está no restaurante do costume a pedir jaquinzinhos com arroz de tomate, às três e picos é hora do café e às cinco já está a arrumar a tralha, que amanhã também é dia. Posto isto, é preciso fazer uma grande pontaria para ligar na hora certa (e também vais perceber que nunca é a hora certa, vão sempre fazer-te sentir que estás a chatear). Não aches estranho se vires uma colega a pintar as unhas na secretária, outra a ler a Nova Gente ou um colega a jogar paciência. Trabalhamos muito, precisamos de momentos de distracção. Também não aches esquisito se nos apanhares ao telefone durante três quartos de hora, a tratar de assuntos tão importantes como a marcação das próximas férias, saber se a criança já arrotou (ou já está a dormir, ou já fez cocó), ou dar palpites sobre o novo namorado da melhor amiga. Evita finanças, segurança social, correios, centros de saúde e outros que tais. Só há duas pessoas a atender meio milhão e é gente de mal com a vida, que vai estar a revirar os olhos e a bufar o tempo todo. Ah, e vai faltar um papel. Não importa qual, não importa para quê, vai faltar sempre um papel. E pronto, é mais ou menos isto. É normal que ao princípio chegues cheio de vigor e vontade de fazer coisas. É normal que comeces a ficar nervoso por as coisas não acontecerem. E também é normal que te habitues, te acomodes comeces a entrar no esquema do deixa andar, do "não se faz hoje, faz-se amanhã... ou depois.. ou então não se faz, que se lixe". Podemos parecer desmazelados e pouco eficientes, mas vais ver que somos malta porreira e descontraída. Para os copos e para a rambóia não há ninguém como nós. Não te faltará companhia para o cinema, jantaradas ou idas à praia. Somos danados para a festa, e apesar de parecermos um bocado sisudos não há gente mais divertida do que nós. Ah, e temos montes de feriados e pontes e esquemas manhosos para juntar dias e só trabalhar aí uns três meses por ano. Vais ver que é espectacular e que não vais querer deixar-nos. É o costume.
Eu não teria conseguido nós descrever melhor que isto, belo texto vale a pena ler e fazer uma introspecção, como eu te compreendo e como tu dizes para a rambóia somos os melhores e concordo contigo plenamente.
ResponderEliminarVicélio